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Ceci n”est pas une pipe


Por Ester Soares, nutricionista

Não tem  espaguete de abobrinha? Escondidinho de quinoa?

Após esta indagação, olhando o buffet com 05 tipos de saladas  (legumes, verduras e frutas), arroz, feijão, repolho refogado, berinjela com salsinha, banana da terra, tutu de feijão além da bisteca de porco e ovo frito e filé de frango. Fiquei meio sem palavras. Um sorriso amarelo. Não havia conseguido atender o pedido da moça vegetariana.

Refleti e falei para o cozinheiro ao meu lado : nossa relação com a comida tornou-se tão obsessiva e cruel que já não sabemos mais (ou não queremos), o que é ser só por ser.

Explico. Fico sim indignada com algumas denominações tipo “espaguete de abobrinha”, carne de jaca, brigadeiro de whey… Nada contra (#sqn), mas acho que a vida e o comer deveriam ser mais simples.

É a incansável busca por milagres. Seja pelo alimento perfeito, seja uma nova dieta, coma isto, não coma aquilo, rico em X, isto também está ficando muito chato.

Se vamos mudar nossa maneira de comer primeiro temos que reaprender a arte de comer e aprender a ver a comida como fonte de saúde, mas também de prazer. E lembrar que aquilo que comemos, quando comemos e o quanto comemos vai além da nossa fome e necessidades.

A ideia é chegar a um patamar onde a comida alimenta e traz felicidade ao invés de gerar doenças, ansiedade e quilos a mais.

Mudar a maneira de comer está longe de ser simples, mas não é impossível. Todos os alimentos que comemos regularmente são aqueles que aprendemos  a comer. Comer é algo que aprendemos. Portanto não é algo fixo, é  algo deliciosamente mutável.

Mas não me venha com seu dedo apontado, dizendo que só como porcaria!

Para o crítico e ativista culinário Michael Pollan, “não existe nada de errado em comer comidas para ocasiões especiais (doces e frituras, por exemplo), pois elas estão associadas aos grandes prazeres da vida. O que  podemos  fazer é reservá-las para esses dias especiais.” E se possível, prepará-las nós mesmos.

O problema que se tem observado é exatamente esse: a maioria das comidas que antes eram reservadas para períodos festivos – carnes e doces, por exemplo – tornaram-se alimentos de consumo diário, quebrando a nossa percepção de associá-las a exceções.

Bee Wilson, jornalista e crítica de comida do The Guardian diz que a forma como abordamos a comida está errada. Vale a leitura!

Foi lendo o artigo que ela escreveu que me fez parar e refletir, para olhar minhas indignações.

Dá para ser feliz, sem culpa ou ansiedades, sem modismos, com saúde, com doces e frituras e vegetais!

Simples assim. Abobrinha sendo abobrinha!

Referências:

Michael Pollan, autor de “Cooked: A Natural History of Transformation”

Bee Wilson, autora de “No diet, no detox: how to relearn the art of eating” (https://www.theguardian.com/lifeandstyle/2016/jan/05/diet-detox-art-healthy-eating)

Figura  –  A Traição das imagens ( La trahison des images) do pintor surrealista belga René Magritte



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