| Habilidades culinárias sempre a nosso favor!

26 de novembro de 2020

Habilidades culinárias sempre a nosso favor!

Por Marluce Nóbrega, nutricionista

Em uma pesquisa feita pela USP com mais de mil mulheres brasileiras de diferentes classes sociais foi demonstrado que os hábitos alimentares mudaram durante a quarentena do COVID-19 onde houve um aumento em 28% do hábito de cozinhar em casa, o hábito de sentar-se à mesa aumentou em 40%, as idas aos supermercados diminuíram cerca de 34% e houve um aumento de 146% dos serviços de entrega. E mais, 41% das participantes deixaram as suas dietas de lado. Muitas mudanças aconteceram onde as tomadas de decisões tiveram importante influência das emoções. Outras pesquisas apresentaram aumento do consumo de alimentos ultraprocessados.

Na pandemia passamos a cozinhar mais por diversos motivos como por cautela de maiores contatos, interesse em comer melhor como forma de cuidar da nossa imunidade e dos nossos familiares, para muitos por economia e para outros como uma forma de relaxar e de acolher as emoções com preparações caseiras, outras afetivas familiares ou com algum outro significado especial.

É natural, eu diria instintivo e intuitivo, querermos nos alimentar bem para nos proteger, para cuidar de alguém ou de nós quando adoecemos. Nesse contexto, também existem evidências de que a prática das habilidades culinárias tem uma relação positiva com a qualidade da alimentação e com comportamentos alimentares saudáveis.

As habilidades culinárias consistem na seleção, pré-preparo, tempero, cozimento, combinação e apresentação dos alimentos segundo o nosso maravilhoso Guia Alimentar para a População Brasileira.

Algo que vinha perdendo força e dando mais espaço para os alimentos ultraprocessados segundo o nosso Guia Alimentar foi a diminuição da partilha de habilidades culinárias. Durante a pandemia houveram mudanças, o que ajudou e motivou muitos a cozinhar, onde aconteceram partilhas de receitas e dicas culinárias das redes sociais, mídias e também entre trocas com amigos e familiares. Ingredientes se transformaram em receitas familiares e mesmo à distância abraçaram muitas pessoas.

Faltou – e ainda falta – tempo entre as várias atividades que tivemos que assumir, mas algumas pausas para preparar a nossa própria comida, sozinhas ou com divisão de tarefas, com mães ou pais com seus filhos ou vice versa (essa é a minha experiência pessoal com o meu pai) vão ficar para sempre no coração de quem as vivenciou e ainda vivencia. Novas relações familiares na cozinha surgiram. Quem nunca teve essa oportunidade por falta de interesse ou por falta de tempo pôde se envolver, se descobrir, fortalecer a sua confiança, se orgulhar e ter autonomia por ter desenvolvido algumas habilidades culinárias. Os que já a tinham usaram a seu favor como uma fonte de renda nesse momento tão delicado em que muitos ficaram e ainda estão desempregados.

Muitas pessoas, assim como eu, aprenderam nesse atual contexto que a habilidade culinária, assim como tantas outras habilidades podem ser desenvolvidas quando praticadas. E o tempo para desenvolvê-las, assim como a qualidade do resultado, só virá com paciência, interesse, curiosidade, dedicação, amor e tempo. Cada um no seu tempo. Não se comparar ajuda e muito nesse processo, assim como em tantos outros.

Pedir ajuda para alguém próximo que saiba cozinhar e você aprecia a comida dessa pessoa pode ser uma experiência e tanto. O mais especial é poder nos alimentarmos e alimentar quem amamos não só com comida, mas com cuidado e amor. Comida é amor e em tempos difíceis ela sempre caiu e cai bem.

Espero que o aumento do hábito de cozinhar em casa se mantenha e possa incentivar mais pessoas a resgatarem esse antigo e valioso hábito.

Valorize e estimule, especialmente quem é profissional da saúde, o desenvolvimento das habilidades culinárias e o ato de cozinhar como estímulo ao autocuidado.

Te desejo ótimas e saborosas experiências!

PS: As fotos fazem parte da minha experiência sozinha e com meu pai nesse período da pandemia Covid-19. Divido com carinho com vocês.

Referências

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia alimentar para a população brasileira / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – 2. ed., 1. reimpr. – Brasília: Ministério da Saúde, 2014

Uggioni PL, Elpo CMF, Geraldo APG, Fernandes AC, Mazzoneto AC, Bernardo GL. Cooking skills during the Covid-19 pandemic. Rev Nutr. 2020;33:e200172

Pesquisa da USP ainda não publicada: Mazzolani BC, Smaira FI, Esteves GP et al. Influence of nutritional status on eating habits and food choice determinants among Brazilian women during the COVID-19 pandemic. 2020. Pré impressão: https://doi.org/10.1101/2020.11.03.20225136

Malta DC, Szwarcwald CL, Barros MBA et al. A pandemia da COVID-19 e as mudanças no estilo de vida dos brasileiros adultos: um estudo transversal. Epidemiol. Serv. Saúde 2020., Brasília, 29(4):e2020407.