Por Karin Dunker, nutricionista
Em nossa prática como profissionais especializados no tratamento dos transtornos alimentares, percebemos de forma muito clara a influência que a família tem no desenvolvimento da imagem corporal e dos transtornos alimentares. Os pais podem influenciar de forma direta por meio de comunicação verbal, com o incentivo a prática de dietas, comentários sobre o peso dos filhos ou de forma indireta, por meio da modelagem, onde os pais expressam seus comportamentos de fazer dieta ou de insatisfação corporal (Bauer et al. 2017; Lydecker et al. 2018).
A maioria dos estudos sobre o assunto apontam a mãe como maior modelo de prática de dietas, de insatisfação com o próprio peso/corpo, como determinante de um maior desejo das filhas pela busca da magreza (Hillard et al. 2016; Klein et al. 2017). Já a relação da figura paterna com as questões de corpo e comida ainda não é totalmente clara (Snoek et al. 2009).
Ao realizar um estudo de avaliação do impacto das práticas parentais sobre a imagem corporal de meninas adolescentes de São Paulo (Guimarães et al, 2020), observamos resultados interessantes. Na percepção das meninas as mães se preocupam mais com peso e alimentação do que os pais. No entanto, observou-se que o pai pode ser tanto um modelo positivo, sendo considerado um fator protetor ao ser um modelo de escolhas saudáveis, quanto negativo, ao fazer provocações sobre peso e incentivar as filhas a fazerem dietas. Limitações do estudo incluem o tamanho da amostra, o fato de ter sido aplicado somente em meninas e em uma faixa etária restrita (12-14 anos), e, portanto, os resultados não indicam causa e efeito.
Alguns outros estudos também apontam efeitos negativos do incentivo a dietas por parte dos pais (Damiano et al, 2015; Klein et al 2017). Lembrando que o grau de insatisfação que o pai tem com seu próprio peso pode por si só ser considerado um risco, Agras et al. (2007), reforça que os pais podem ser mais sensíveis e críticos com o peso da filha e esposa, desaprovando o excesso de peso de forma direta ou indireta.
Apesar de ainda ser precipitado afirmar que essa percepção corporal distorcida pela influência paterna leva as crianças e adolescentes à comportamentos característicos de transtorno alimentar, vale reforçar que existe uma influência, e que não somente a mãe, mas também o pai deve ser incluído em ações de conscientização na prevenção de problemas relacionados ao peso em crianças e adolescentes.
Pequenas ações que trazem efeitos positivos incluem o incentivo às refeições em família, atentando para a importância do modelo dos pais à mesa, evitando o incentivo à restrição alimentar e comentários sobre peso e forma. Ambos pais devem estimular um ambiente de tranquilidade, comunicação e aceitação, para que, dessa forma, se construa uma autoestima e autoimagem positiva.
Referencias:
Agras WS, Bryson S, Hammer LD, Kraemer HC. Childhood risk factors for thin body preoccupation and social pressure to be thin. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry.2007;46(2):171-8
Bauer A, Schneider S, Waldorf M, et al. Familial transmission of a body-related attentional bias – An eye-tracking study in a nonclinical sample of female adolescents and their mothers. PLoS One. 2017;12:e0188186.
Guimarães TJ, Perez A, Dunker KLL. Impacto de práticas parentais de peso e dieta na imagem corporal de adolescentes do sexo feminino. J Bras Psiquiatr. 2020; 69:31-7.
Hillard EE, Gondoli DM, Corning AF, et al. In it together: Mother talk of weight concerns moderates negative outcomes of encouragement to lose weight on daughter body dissatisfaction and disordered eating. Body Image. 2016; 16:21-7.
Klein KM, Brown TA, Kennedy GA, et al. Examination of parental dieting and comments as risk factors for increased drive for thinness in men and women at 20-year follow-up. Int J Eat Disord. 2017; 50:490-7.
Lydecker JA, Riley KE, Grilo CM. Associations of parents’ self, child, and other “fat talk” with child eating behaviors and weight. Int J Eat Disord. 2018; 51:527-34.
Snoek HM, van Strien T, Janssens JM, et al. Longitudinal relationships between fathers’, mothers’, and adolescents’ restrained eating. Appetite. 2009; 52:461-8.
Damiano SR, Gregg KJ, Spiel EC, et al. Relationships between body size attitudes and body image of 4-year-old boys and girls, and attitudes of their fathers and mothers. J Eat Disord; 2015; 3:1–10.