Meu foco de indignação do momento (na área alimentar) é a dieta paleolítica ou paleo diet. Não ouviu falar? Tem a premissa estúpida de comer aquilo que nossos ancestrais ?caçador-coletores? da era paleolítica ? ou Idade da Pedra ? comiam.
Uma proposta inserida na paleo diet é também o ?jejum intermitente?, como colocado numa matéria daquelas que só alardeiam a imbecilidade publicada na Vogue recentemente, incluindo a pérola de um endocrinologista que diz que ?acelera o emagrecimento?. A cólera também! E acelera mais rápido. Se perder numa floresta e ficar andando a esmo também ?acelera o emagrecimento?!! Poupe-me.
Definitivamente: isto é apenas uma reedição das dietas de baixo carboidrato, que já se provaram ineficientes e que já perderam público. Daí vem um nome diferente, livros diferentes, e crenças disfuncionais novas para vender antigas promessas ao público faminto por milagres e invencionices.
Surpreende ainda que alguns artigos científicos se debrucem a discutir os possíveis benefícios da ?dieta paleolítica?. Embora se acredite que nosso genoma tenha mudado pouco desde os tempos ancestrais (e nossa dieta muito!), e que estamos comendo ultraprocessados demais, fibras de menos, tendo impacto negativo de alguns processos de produção de alimento em massa, etc., dizer que a dieta ?pré-agricultura? possa ser um paradigma é demais.Como alimentar toda população do mundo sem a agricultura moderna?
O homem das cavernas ? segundo a arqueologia da alimentação ? comia também carniça, larvas e fetos de animais. Isto está sendo proposto também e considerado nos estudos sobre a ?saúde? e ?nutrição? do homem ancestral?? Vamos também voltar aos hábitos de ?higiene e saneamento? do homem das cavernas?
E os praticantes da dieta paleolítica estariam também dispostos a abrir mão do que temos hoje e que não existia na época das cavernas? Carro, energia elétrica, televisão, celular, computador, etc.?
Realmente! É mais honesto ser Amish people!!!
É óbvio que o mundo ?moderno? tem influência em nossa saúde e dieta! O humano moderno vive numa sociedade ?dependente de computador, privada de sono, fisicamente inativa, cronicamente estressada e com abundância de comida? ? e comida processada demais (Chaput et al., 2012). Mas então, vamos lutar por uma produção de alimento mais racional, por políticas alimentares que visem acesso a alimentos mais saudáveis, pela valorização e preservação do consumo de alimentos frescos, pelo contato direto com a comida, pelas culinárias regionais, pelos pequenos produtores, enfim…
Mas daí, querer defender a dieta do homem das cavernas?????
Se os praticantes e defensores passarem também a andar de carroça, comer apenas o que plantam, vestir apenas o que costuram, abandonar a energia elétrica, e todas as tecnologias (como os Amish), merecerão parte do meu respeito.
Para complementar:
Outras Fontes:
Leonard WR. Alimentos e Evolução Humana. In: Scientific American Brasil. Especial Evolução, nº. 2. 2004. Págs. 80-89.
Eaton SB, Eaton SB III. Paleolithic vs. modern diets ? selected pathophysiological implications. Eur J Nutr 39, 67-70, 2000.
Eaton SB, Eaton SB III & Konner MJ (1997): Paleolithic nutrition revisited: A twelve-year retrospective on its nature and implications. Eur. J. Clin. Nut. 51, 207-216.
Baschetti R. Paleolithic diet. [Comments on: Eaton SB, Eaton SB III & Konner MJ (1997): Paleolithic nutrition revisited: A twelve-year retrospective on its nature and implications. Eur. J. Clin. Nut. 51, 207-216.]
Chaput JP, Doucet E, Tremblay A. Obesity: a disease or a biological adaptation? An update. Obesity Reviews 2012; 1-11.